Faz 20 anos que o CRCA – Centro de Referência em Cooperativismo e Associativismo - foi fundado em Campinas, SP. No início era para responder às demandas da Cáritas Arquidiocesana de Campinas para a organização de empreendimentos populares que a mesma estava apoiando na perspectiva da inclusão produtiva e geração de renda. Esse conceito nem era ainda conhecido como tal. Era uma estratégia de apoio aos grupos populares que necessitavam gerar renda e com urgência. Pois, como dizia a querida Irmã Elene (então coordenadora da Cáritas Arquidiocesana) “a fome tem pressa.” Eram empreendimentos de trabalhadores da construção civil desempregados, uma cozinha industrial e uma fábrica de velas. Depois, no decorrer dos anos vieram mais outros grupos: - um grupo de costura e confecções e de catadores de materiais recicláveis. Esses últimos estimulados por membros da paróquia Nossa Senhora Aparecida do Jardim Proença de Campinas em resposta a Campanha da Fraternidade de 1999 – Fraternidade e desemprego – Sem trabalho...Por quê?
Diante do crescimento rápido do volume das demanda por organização desses empreendimentos ou melhor, desses grupos que necessitavam gerar renda, o CRCA organizou um documento intitulado por “Metodologia de incubação de empreendimentos econômicos populares”. Um conjunto de passos para melhor organizar e construir as opções de renda, principalmente para com os grupos de catadores de materiais recicláveis – os maiores grupos e com uma característica muito rápida de geração de renda. Pois, materiais recicláveis possuem um potencial de geração de renda cotidiana. É muito comum catadores “trabalharem para o dia”, como dizem.
Essa metodologia guardava a origem dos princípios “VER, JULGAR e AGIR” da prática social da igreja católica da década de 60. Primeiro o “estudo da situação”, segundo a “apreciação da situação a luz dos princípios da prática cristã católica” e o terceiro o “exame e determinação do que se podia fazer para as mudanças necessárias”. Fazendo um salto histórico e, um pouco distante conceitualmente da doutrina social da igreja católica, temos na década de 1990 o surgimento da Teoria da Mudança (TdM) que, preocupados, com o (a falta) sucesso dos projetos sociais apresenta uma conjunto de ferramentas objetivadas em 4 passos. A saber: - envolva os diversos stakeholders (atores e/ou agentes) no processo de análise do problema social em questão; - conheça profundamente o problema (análise situacional); - defina os objetivos de longo prazo e como avalia-los (indicadores de impacto); e por último - estruture a uma teoria da mudança própria ao problema examinado. Afirmo, que essa última metodologia (TdM) nos aproxima mais da prática atual do CRCA.
Entretanto, por mais que estejamos estudando e trabalhando na construção de uma metodologia de organização dos empreendimentos econômicos populares, também denominados por estratégias de incubação de empreendimentos econômicos populares, um documento possui maior relevância nessa estratégia metodológica que é o “plano de negócio” do empreendimento proposto.
Conceitualmente um plano de negócio é um documento que descreve em detalhes um objetivo econômico a ser alcançado por um novo negócio. Incluindo informações tributárias, custos (fixos variáveis e médio) , despesas, valores projetados de vendas/faturamento, concorrência de mercado e estratégias para o sucesso do projeto econômico de curto, médio e longo prazos. É uma projeção econômica do negócio antes de sua instalação. Em síntese, os objetivos de um plano de negócio são: - diminuição dos riscos econômicos e financeiros do empreendimento que se deseja estruturar; - identificar como se deve estruturar ou organizar o empreendimento (burocracia e hierarquia); - projetar os custos, volume de vendas necessárias para os resultados (lucros) esperados; e definir os planos de marketing do produtos e/ou dos serviços. Neste último objetivo as definições dos pontos fortes, oportunidades, fraquezas e ameaças (Matriz SWOT ou FOFA).
Junta-se, ao plano de negócio, os modelos de empreendimentos já estruturados e que deram certos. Isso denominamos por Benchmark – análise estratégica das melhores práticas usadas por outros negócios já constituídos e que deram certos. Também vale a pena estudar aqueles que não deram certo. Pois, aprender com os erros também é importante.
Como prática pessoal trabalhando nesses anos todos com grupos de pessoas em situação de vulnerabilidade econômica e social costumo começar essa reunião sobre plano de negócio da seguinte forma (ou diálogo): Quanto vocês querem ganhar, em termos financeiros, por mês deste nosso negócio? Depois de muitas rodas de conversas, exercício de pensar o quanto se precisa de recursos financeiros para viver em nossos dias, quanto tempo se deseja trabalhar e a forma de como será organizado o empreendimento, entre outros detalhes, chega-se a um valor razoável entre o desejo e a realidade organizacional dos membros do grupo. Invariavelmente os valores iniciais não superam muito a 1 salário-mínimo.
Continuando o diálogo (muitas rodas de conversas) inicia-se, então, o ato de “projetar” os grandes números do empreendimento. Quantas pessoas estão envolvidas no negócio? Quem vai trabalhar diretamente na produção? Quem vai coordenar? O que fazemos com as faltas e atrasos? Vamos produzir por hora-trabalhada ou por produtividade? Quem vai controlar a produção? Como vamos produzir? Quanto custa produzir? Como vamos vender? Quem vai vender? O que vamos comprar? Como vamos comprar os equipamentos? Onde será o local de produção? E finalmente chega-se ao situação: Para ganharmos o que queremos teremos que produzir e vender isso ou aquilo na quantidade suficiente para nos pagar e para todos as despesas e impostos. Está criado as bases de um plano de negócio para o empreendimento.
As tarefa de estruturação das bases de um plano de negócio, organizar a produção, estabelecer uma dinâmica de trabalho e produção, harmonizar os interesses individuais e coletivos (muito difícil), realização das vendas, faturamento, organização documental contábil, pagamentos dos impostos, definição dos valores destinados aos fundos obrigatórios (quando de uma cooperativa), forma de divisão dos resultados entre outros denominados e definidos pela estratégia de incubação específico do empreendimento inicia-se o projeto de desincubação de empreendimento. Isto é, a busca pela autonomia econômica, financeira e estrutural do empreendimento. Mas, isso é para outro texto para nosso blog.
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